E se o mundo acabar?

Um dia o mundo parou. Fui parando bem aos pouquinhos fui acreditando que ia dar certo fui levando um tanto quanto leve o que deveria ter peso. Ainda assim, o peso veio. O peso sempre vem, mesmo quando a gente se esconde. Se abate, assim de repente ou não. Não foi de repente, na verdade. Talvez nunca seja. Talvez pareça de repente mas na realidade tudo está/estava aí o tempo todo. E então o mundo parou. As ruas não são as mesmas e as pessoas não são as mesmas e talvez nunca mais sejam. É tão estranho pensar no futuro agora. Como se a impossibilidade da previsão misturada com a mudança brusca fizesse tudo ficar nublado. Eu vejo mato, sempre, de qualquer forma, no futuro. Se o mundo afundar de vez e a humanidade sucumbir a brutalidade e tudo for diferente, os canais de Veneza tem agora águas cristalinas. Os canais de Veneza tem águas cristalinas. O céu é azul na China, agora. Como a muito não. Tudo como a muito não. A terra precisava dessa pausa. Fico imaginando essa entidade bonita e enorme pensando muito profundamente que precisa de um tempo no relacionamento e então ela nos manda essa. Porque a gente é abusivo pra caralho. A gente é abusivo até dizer chega. Destruímos e poluímos e todos os ímos ruins que se puder pensar.

Eu penso no futuro e a primeira coisa que me vem – mais do que o desejo de fugir pro mato – é a saudade. Saudade saudade saudade. Essa palavra bonita de dizer e terrível de sentir. O coração apertado pensando em quando vai acontecer o próximo abraço. Meus irmãos, amigos, minha mãe. Quando? É difícil não se deixar levar pela tristeza. Um mar inteiro de melancolia, e eu já sou naturalmente melancólica até o osso. Acho que nasci assim. A maioria das crianças é feliz, mas eu já era esse pocinho bonito de tristeza, mesmo pequena. Eu largava um brinquedo pelo outro e então meu coração doía. Imaginava o brinquedo sozinho, se sentindo abandonado. Imaginava como devia ser triste não poder se mexer e procurar outros amigos. E então eu tentava usar e ser tudo ao mesmo tempo, tudo, pra ver se eu não sentia tristeza. Demorei muito tempo pra entender que ela é parte de quem eu sou e aceitar que dentro do meu peito moram – lembranças de outra vida, vai ver – uma solidão e uma melancolia desmedidas. Não tem cura pro que se é. E se tiver, não quero mais, também. É bom sentir, mesmo o que dói. É nessas que a gente se entende e se descobre.

E se o mundo acabar? Me pergunto, pra logo em seguida pensar: e se não? E se for um começo? E se for uma quebra? Na essência da vida e da natureza mora a impermanência. Nada deve ser igual. Nada é eterno. Tudo começa e recomeça e começa e recomeça e assim as coisas andam. E se o mundo acabar, mas no dia seguinte eu abrir os olhos e levantar da cama? E então eu vou sair e fazer todas as coisas. Abraçar todas as pessoas. Declarar todos os amores. Terminar o dia deitada na grama com aquele calor no peito que diz que tudo valeu a pena. O sol na fuça e aquela paz que vem do fundo. Um dia. E se o mundo acabar? A gente começa tudo de novo.

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